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Há 30 anos, o mundo conhecia alguns personagens que marcariam para sempre a Cultura Pop. Uma empresa que já existia há quase uma década trazia o primeiro longa-metragem animado por computador, Toy Story.
O filme trazia um olhar e uma magia diferente, pois tinha como protagonistas os brinquedos de Andy, um garoto de 6 anos com uma mente fértil. O personagem principal da história era Woody, um caubói de borracha e tecido e o brinquedo favorito do garoto, que via na chegada do tecnológico Buzz Lightyear uma ameaça ao seu trono.
Mas como essa história conversa com a identidade e a finitude?
Todos sabemos que há um momento inevitável na vida de todo ser humano: aquele em que a gente percebe que as coisas mudam, mesmo quando não queremos. Que pessoas se afastam, ciclos terminam e aquilo que um dia foi o centro da nossa existência se torna apenas uma lembrança confortável no fundo de uma gaveta.
A Pixar soube disso desde o início. E Toy Story sempre foi sobre isso.
Brinquedos que não são sobre brinquedos
À primeira vista, a saga dos brinquedos falantes é uma aventura infantil sobre amizade e lealdade. Mas basta olhar com um pouco mais de atenção para perceber que Woody, Buzz e companhia não são personagens de plástico, borracha e tecido: são metáforas sofisticadas para o que significa ter um propósito, perdê-lo e tentar reencontrá-lo.
Woody, por exemplo, nasce com um sentido muito claro: como dito no começo desse texto, ele apenas queria ser e se manter o brinquedo preferido de Andy. Toda a sua identidade gira em torno disso. O amor, a função, o valor que tem no mundo, tudo depende do olhar daquele garoto. Ao longo dos filmes seguintes vemos Andy crescer, o que faz com que Woody se veja diante de uma crise existencial profunda: se ele não serve mais ao menino, quem ele é?
A pergunta pode parecer simples para um brinquedo, mas ela ecoa em qualquer adulto que já teve que repensar a própria vida quando um emprego acabou, um relacionamento terminou ou um sonho precisou mudar de forma.
A dor inevitável do fim dos ciclos
Toy Story não disfarça a dor da passagem do tempo. Pelo contrário, coloca-a no centro da narrativa. E isso é o que torna a franquia tão especial.
A despedida de Andy no terceiro filme, por exemplo, é um dos momentos mais emocionantes do cinema justamente porque todos nós já fomos Andy, e todos nós já fomos Woody. Já estivemos do lado de quem precisa seguir adiante e do lado de quem precisa aprender a deixar ir. Quem escuta o Encontroverso sabe como sou “chorão” e deve imaginar o rio de lágrimas que essa cena me fez criar.
A cena em que o garoto entrega seus brinquedos para Bonnie não é apenas sobre doação: é sobre aceitar que o amor também muda de forma. Ele não deixa de amar Woody, mas aquele amor já não cabe mais na mesma história. E Woody precisa entender que isso não o torna menos importante. Só significa que chegou a hora de outro capítulo.
O sentido não é fixo, ele se transforma
Na vida real, somos ensinados a buscar “um propósito” como se fosse algo definitivo. Mas Toy Story nos lembra que o sentido das coisas pode, e deve, mudar com o tempo.
Buzz Lightyear passa de um herói intergaláctico iludido a um companheiro fiel. Jessie encontra um novo lar depois do abandono. E Woody descobre que pode continuar sendo útil mesmo que não seja mais o brinquedo favorito.
Essa é talvez a lição mais bonita do filme: a identidade não está no papel que desempenhamos, mas na capacidade de nos reinventarmos quando esse papel termina.
Último Ato
No fim das contas, Toy Story nunca foi apenas sobre brinquedos. Foi sobre crescer, perder e recomeçar. Sobre entender que nada dura para sempre e que isso não precisa ser triste. É, na verdade, o que dá significado à jornada.
Assim como Woody, todos nós vamos enfrentar momentos em que precisamos nos despedir do que fomos. E, como ele, vamos descobrir que a vida continua. Não igual, mas com um novo propósito esperando para ser vivido.
José Maria Santiago, médico psiquiatra e professor de medicina, é um explorador da mente humana e um aficionado por cultura pop. Entre aulas e consultas, também encontra tempo para debater filmes, séries e games no seu podcast, o Encontroverso, onde o cérebro e o entretenimento se encontram. Especialista em fazer a ciência caber numa conversa de café e em emitir opiniões baseadas em certezas que não tem, acredita que o equilíbrio está entre a compreensão profunda da psique e uma maratona de filmes ruins bem escolhida!
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Respostas de 3
Texto espetacular, meu amigo
Vou procurar aqui para reassistir todos os filmes
Obrigado!
Muito obrigado, meu amigo!
Profundo muito profundo, nunca tinha visto por esse lado mais realmente é isso, vou assistir com minha filha mais nova ele, valeu meu amigo.